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#278 Deus é Capaz de Fazer o Mal?

May 13, 2015
Q

Caro Dr Craig

Eu espero que você não se importe em responder a uma pergunta de um ateu, se for solicitado com toda a seriedade e com o maior respeito. A minha pergunta diz respeito a Deus e à moralidade. Eu ouvi você dizer que Deus é "essencialmente" bom, por isso eu suponho que você quer dizer que a bondade de Deus é uma parte necessária do seu ser e caráter. Eu também ouvi você dizer que ser onipotente não envolve uma habilidade para Deus de ir contra a sua própria natureza. Isto parece implicar que Deus não é capaz de fazer o mal.

Assim, a minha primeira pergunta é - P1: Será que Deus é capaz de fazer o mal?

Se a resposta for "não", não está claro para mim como Deus pode ser considerado bom, como certamente uma parte importante de ser bom é ter a capacidade de fazer o mal, mas a escolha de não o fazer. Se Deus não é capaz de fazer o mal, Ele não se torna uma espécie de autômato moral e não digno de louvor (pelo menos no sentido moral)?

Se, por outro lado, a resposta a P1 é "Sim, ele pode fazer o mal, mas sempre opta por não fazê-lo", isso significaria que existe algum "mundo possível" no qual ele faz o mal (pois que outro significado da palavra "pode" existe?). A pergunta torna-se então - P2: Como habitantes desses mundos possíveis deveriam responder aos atos malignos de Deus? Será que o mal se torna bom nesses mundos (uma contradição) ou Deus iria tornar-se mal (violando a necessidade de Sua bondade)? (Eu percebo que a pergunta acima sugere um uso semântico errado de "mundo possível", mas eu acho que você me entende)

Em um formato de perguntas direto como este é difícil entrar em uma discussão significativa, então eu espero que você me perdoe se eu tentar antecipar algumas de suas possíveis respostas e dar uma breve resposta a estas.

Resposta (R) 1: Sim, Deus pode fazer o mal, mas não existe um mundo possível em que Ele faz o mal. A minha resposta # 1 para Resposta 1 (AR1) : É difícil ver o que a palavra "pode" significa neste contexto.

Resposta (R) 2: Sim, Deus pode fazer o mal, mas não existe um mundo possível em que Ele quer fazer o mal. A minha resposta # 2 para Resposta 1 (A2R1): Haveria ainda um mundo possível em que Ele faz o mal, como até mesmo é esperado dos seres humanos fazerem coisas contrárias aos seus desejos.

Resposta 3: Não Deus não pode fazer o mal. Mas Ele ainda é digno de louvor, simplesmente porque é parte de sua natureza essencial ser digno de louvor. A minha resposta # 3 para Resposta 1 (A3R1): Isso significa que a bondade de Deus é um tipo totalmente diferente de bondade do que a dos seres humanos, que só se tornam digno de louvor em virtude das livres escolhas que fazem. Mas como, então, podemos interpretar a noção bíblica de que somos feitos à imagem e semelhança de Deus (que eu sempre achei que se referia - pelo menos em parte - ao nosso status compartilhado como seres morais).

A minha resposta # 3 para R2 (A3R2): Isto parece fazer com que todas as noções de bondade e de merecimento sejam sem sentido ao aplicarem-se a Deus. Elas se tornam inteiramente separadas do significado que normalmente atribuímos a estes termos.

Obrigado por tirar tempo para considerar a minha pergunta.

David

Austrália

  • Australia

Dr. Craig

Dr. craig’s response


A [

Eu amo perguntas sérias de ateus, David! Suas perguntas são boas, também.

Sim, eu afirmo que o ser de Deus, sendo essencialmente bom, significa que a bondade é uma propriedade que não poderia ter faltado em Deus. De fato, no meu ponto de vista (visão), Deus simplesmente é o paradigma da bondade em todos os mundos possíveis. Isto implica que Deus não pode fazer o mal, já que isso seria contrário à Sua própria natureza.

Portanto, a resposta para P1: "Deus é capaz de fazer o mal?" é não. Isso implica que P2, assim como AR1 e AR2 são desnecessárias.

Agora, em resposta a uma resposta negativa à P1, você expressa algumas preocupações importantes. Em primeiro lugar, "não está claro para mim como Deus pode ser considerado bom, como certamente uma parte importante de ser bom é ter a capacidade de fazer o mal, mas a escolha de não o fazer." Aqui eu acho que você está confundindo o valor moral com os deveres morais, David. A liberdade da vontade é importante para a responsabilidade moral, para o louvor e culpa moral, na realização de deveres morais de alguém. Mas Deus sendo o paradigma de valor moral exige apenas que Ele tenha várias qualidades como a bondade, justiça, compaixão, e assim por diante, que serve para determinar o conteúdo da bondade moral.

Sua segunda preocupação é mais apropriada: "Se Deus não é capaz de fazer o mal Ele não se torna uma espécie de autômato moral, e não digno de louvor (pelo menos no sentido moral)?" Aqui a alegação é que um ser que não tem a liberdade de fazer o mal não pode ser elogiado por cumprir seus deveres morais. Parece-me que há algumas respostas a isto.

Em primeiro lugar, você supõe que a liberdade implica a capacidade de fazer o oposto do que se faz. Eu estou convencido de que isso não é verdade. Considere o exemplo bem conhecido de alguém que, sem que ele soubesse, teve seu cérebro envolto com eletrodos de controle remoto por um cientista louco que é um apoiador de Obama. Quando o homem entra na cabine de votação, se ele vota para Obama, o cientista louco não fará nada. Mas se ele vai para votar em Romney, o cientista louco ativa os eletrodos, que lhe provoca a votar em Obama em vez disso. Agora claramente o homem não tem poder nesta situação para votar em Romney. Mas se ele entra e vota para Obama, ele não o faz livremente? Afinal, o cientista não fez nada neste caso! É como se o homem não estivesse conectado com eletrodos. Este experimento de pensamento sugere que o que é crucial para a liberdade da vontade não é a capacidade de fazer o oposto, mas a ausência de restrições causais externas sobre a escolha de alguém: é inteiramente por sua conta. No caso de Deus, Ele é claramente livre de tais constrangimentos causais externos e, portanto, faz livremente o bem. Então Ele não é de todo um autômato moral, mas um agente livre.

Em segundo lugar, na minha teoria preferida da ética do comando divino, deveres morais surgem como resultado de imperativos divinos. Os nossos deveres morais são constituídos por mandamentos de Deus. Agora, como Deus presumivelmente não emite nenhum comando para Si mesmo, Ele literalmente não tem deveres morais para cumprir. Se Deus não cumpre deveres morais, então em que sentido Ele é moralmente louvável? Aqui a distinção de Immanuel Kant entre agindo por dever e agindo por conformidade com o dever é útil. Deus pode agir livremente de forma que para nós seria como seguir regras e assim ser louvável no sentido do nosso cumprimento dos nossos deveres morais, para que Deus possa ser, de forma semelhante, chamado louvável de forma analógica. Essa concepção nos ajuda a compreender o sentido em que Deus é digno de ser louvado: não no sentido de recomendação para executar plenamente Seus deveres (uma vez que Ele não tem nenhum), mas sim no sentido de adoração por Sua perfeição moral.

Isso não quer dizer com AR3 que "Ele ainda é digno de louvor, simplesmente porque é parte de sua natureza essencial ser digno de louvor." Eu concordo com você que essa resposta faria "as noções de bondade e de merecimento sejam sem sentido ao aplicarem-se a Deus." Em vez disso eu dei uma explicação da fundamentação dos valores morais em Deus, Sua liberdade e Sua relação com o dever moral que explica essas noções. Como um agente livre que exemplifica todas essas várias perfeições morais e que age livremente de acordo com o dever, Deus é bom em um sentido muito reconhecível.

- William Lane Craig